quarta-feira, 16 de novembro de 2016

A RAPARIGA QUE NÃO QUERIA CASAR

JOAQUIM SILVA GOMES
O episódio que quero aqui apresentar ocorreu em França, e envolveu o divórcio de um casamento que não chegou a acontecer. O caso envolveu um rapaz e uma rapariga da alta sociedade parisiense e acabou em tribunal.

Tudo começou quando a família da jovem rapariga francesa negociou o seu casamento com o rapaz de outra família distinta de Paris. A rapariga tinha 17 anos e o rapaz 24.

Com o consentimento do rapaz e pouco entusiasmo da rapariga, o casamento civil realizou-se no “7.º arrondissement”, em Paris, perante a presença de várias dezenas de convidados, todos eles pertencentes à elite social parisiense. 

Para o dia seguinte ficou marcado o casamento religioso. Reservado um digníssimo espaço católico, contratados dos melhores cozinheiros de Paris, embelezado o espaço para o baile, tudo foi preparado ao pormenor e com grande distinção. Mas um grave problema foi colocado quando ninguém esperava: a rapariga, determinada e intransigente, resolveu quebrar o acordo estabelecido entre as duas famílias e não aceitou casar com o seu noivo.

No dia anterior, à noite, poucas horas antes do início da cerimónia religiosa, a rapariga resolveu abordar os seus pais e, com firmeza, proferiu as palavras que ninguém esperaria ouvir nesse momento: “Não caso, e tenho dicto!” (1)

Alarmada e muito preocupada, a sua família ainda tentou demover as pretensões da jovem, mas não conseguiram. Não restando outra solução, os familiares da noiva, quase esposa, resolveram de imediato enviar telegramas a todos os convidados, dando-lhes conta da decisão da noiva. A informação foi, também, dada à família do noivo, que ficou chocada com a decisão da jovem.

O ex. futuro marido da rapariga ainda tentou convencer a noiva, mas em vão, esbarrando com a intransigência da rapariga.

Como os jovens já se encontravam casados por civil, a lei francesa autorizou a anulação do casamento, dando ao quase marido da jovem a possibilidade de reclamar, de futuro, e em tribunal, as “perdas e danos”, se assim o entendesse.

O tempo passou e a esperança do ex. futuro marido em casar com a jovem manteve-se viva, até ao momento em que a rapariga resolveu casar com um rapaz por quem efectivamente se apaixonou.

Desta vez o casamento chegou a realizar-se, com cerimónia civil e cerimónia religiosa, como “mandavam” as boas práticas francesas. 

Foi então que o marido n.º 1, verificando que a sua ex. futura esposa tinha encontrado o seu verdadeiro amor, resolveu levar o caso a tribunal, pedindo à jovem uma avultada indemnização monetária. 

Quando os recém-casados regressaram a Paris, depois de terem passado uma apaixonante lua-de-mel em terras de Espanha, encontraram na sua caixa de correio uma notificação judicial, apresentada pelo “marido n.º 1”, na qual reclamava a avultada quantia de “13000 francos de perdas e danos materiais com a venda da mobília, enxoval, etc, que tinha preparado, e 60:000 francos… para bálsamo ao seu coração escalavrado” (1)

Preocupados com este pedido, o casal lá teve que se apresentar em tribunal, para refutar estas acusações e evitar esta elevada indemnização que lhes era solicitada. 

Enquanto a sentença deste caso não foi proferida, a família da jovem, a família do “marido n.º 1” e a família do “marido n.º 2” viveram momentos de grande incerteza e ansiedade. Foi então que a sentença, proferida no dia 7 de Janeiro de 1926, determinou que o marido n.º 1 nada tinha a receber da sua ex. futura esposa, nem sequer do marido n.º 2.

Depois desta sentença a tranquilidade (aparente ou não) regressou ao casal e às suas famílias. E os dois acabaram com juras de amor e paixão para toda a vida. 

E não é que viveram mesmo felizes para sempre?! 

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1) – Jornal “Diário do Minho”, de 15 de Julho de 1926.

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