segunda-feira, 23 de março de 2015

ARES DE PRIMAVERA

CLARA CORREIA
Ei-la que chegou! … a Primavera, pois! … quanto mais não seja a reboque da implacabilidade do calendário que dita ao Tempo que é chegado o tempo de nova estação e … assunto encerrado! … mau grado os eventuais caprichos de outro tempo, o meteorológico, a meter-nos na linha no que respeita à nossa modesta e legítima ambição de pôr os casacos, não pelas costas, mas para trás delas. Não obstante, o sol, quando não lhe é tirado o protagonismo pelas nuvens, prolonga a sua anterior, e invernosa, “visita de médico” … e agora até parece, e ainda bem, utente do SNS nas urgências e no auge da gripe.

Somos mediterrânicos, benza-nos Deus! … e quem nos tira o Sol, tira-nos tudo e mais alguma coisa, nomeadamente, a vontade de não nos encafuarmos nos centros comerciais onde, como no mar (e como escreveu Sophia de Mello Breyner), não há estações do ano, mas com a agravante de também não haver condições de vida para a chamada “luz natural”, nem condições acústicas para se propagar a melodia do vento, nem, tão pouco, as imprevisibilidades paisagísticas da serra ao longe, excepcionalmente bem delineada por ausência de neblina, ou de um hipnótico crepúsculo carmim-electrizante a encher-nos as medidas dos sentidos e da objectiva da máquina fotográfica.

Pois a verdade (e esta verdade, além de absoluta, merece ser celebrada por ser anual) é que, mais tarde ou mais cedo, e mais ou menos pela altura pascal, todos nós damos um ar da nossa graça primaveril (abafada pelo Inverno), seja no sumiço dado às golas altas e nos pedaços de pele exposta a flirtar os raios solares, seja nos comentários inevitáveis à meteorologia, que passam, finalmente, a barreira da monotonia e do pessimismo e, sendo Primavera, aumenta o risco de serem acompanhados por um largo sorriso … primaveril, claro está! Há, e haverá sempre (claro esta, também!) espíritos impermeáveis a estes preâmbulos de “silly season” e, sem qualquer presunção de julgamento, terão a sua própria razão e direito de opção. Apanhemos, enfim, a onda do renascimento sazonal da Natureza, por excelência, e renovemos a nossa alma, as intenções esquecidas, as relações esmorecidas e conceitos já com mofo, não só da humidade do Inverno mas também da mente, se esta resiste à mudança … e à esperança, a precisar, também ela (a nossa esperança) dos ares de Primavera!

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