domingo, 11 de setembro de 2016

PUBLICAR NOS TEMPOS ATUAIS?

JORGE NUNO 
Como estreante com um romance – cuja sessão de lançamento ocorreu já 2013 –, pelas experiências anteriores relativas à minha participação em duas dezenas de coletâneas de contos e poesia, como produtor de conteúdos e também pelo meu olhar, como consumidor e como observador atento da realidade do meio literário, onde me vejo envolvido, senti um impulso enorme para escrever algo relacionado com o tema em título. E cá estou… convicto do interesse desta minha reflexão.

Posso congratular-me pelo facto de três editoras terem aceitado publicar o meu primeiro livro a solo, caso que não é muito frequente no panorama atual – em boa verdade, tratava-se de pequenas editoras e uma delas até referiu a dado passo das negociações : “Que garantias me dá? Há que ter algum cuidado nos tempos que correm” –.

Tentando estabelecer paralelos entre editoras, ao nível das condições fixadas para publicação, ouso divulgar o seguinte: numa, mesmo na qualidade de autor, tinha que adquirir 250 livros, noutra 180 livros e noutra um mínimo de 100 livros, com direitos de autor que iriam entre os 3% e 30%, consoante o “risco calculado” (?) ou política da editora, para autores desconhecidos e consoante o número de exemplares adquiridos pelo autor. O meu investimento, como autor, situava-se então entre os 1080 euros e os 2428 euros. É preciso ser-se ousado, ter coragem, acreditar no seu “produto” concebido e ter algum suporte financeiro para despesas deste tipo, em tempos com resquícios de crise, que aos poucos se tem vindo a desvanecer.

Uns meses depois, uma jovem amiga, amante da escrita e particularmente da poesia, que tem um conhecido blogue e que teve tempo de antena (entrevista e reportagem) num programa da manhã, na TV, perguntava qualquer coisa como isto, numa rede social: “Pode-se viver só da escrita?”. Eu, como amigo e como pessoa experiente, que teve que lutar muito na vida para atingir vários patamares de objetivos, aceitei o repto e respondi. Não me lembro bem das palavras que lhe dirigi, mas de uma maneira soft, com poucas palavras, tentei fazê-la descer à terra, sem querer de modo algum destruir os seus sonhos e concluí, incentivando-a a escrever, mas procurando outro suporte para poder viver condignamente.

Decorrido mais uma semana, uma outra minha amiga, poetisa, aposentada, na casa dos 70 anos, que tinha sido incentivada por mim a participar numa coletânea de poesia, quando recebeu a conta antecipada de 60 euros, um mês antes da publicação, disse-me que ia escrever à editora a renunciar, pois não tinha esse dinheiro para pagar pelos três livros, como mínimo exigido.

Cerca de um ano depois do lançamento do meu livro a solo, um meu amigo, poeta, aposentado como professor de Língua Portuguesa, que também tinha sido incentivado por mim a participar numa outra coletânea de poesia, telefonou-me a dizer que tinha acabado de receber uma carta da editora para pagar antecipadamente 100 euro pela aquisição de 10 livros, a que obrigatoriamente se via comprometido. Perguntou-me: “Isto é normal?”, depreendendo, pelo continuar da conversa, a sua pouca convicção da justeza do pagamento a mais de um mês da saída do livro. Como tinha algum poder económico, seguiu em frente. Reconheço-lhe muito talento mas, curiosamente, nunca mais o vi participar em coletâneas.

Por essa ocasião, vi uma notícia na TV que apontava para uma diminuição de vendas no mercado livreiro, relativo ao ano de 2012. Segundo dados da GFK, citada pela estação de televisão, a redução foi da ordem dos 9% e corresponde a cerca de um milhão de livros.

Interessei-me pelo assunto e pesquisei, tendo encontrado na blogosfera uma notícia, publicada em 29 de abril de 2013, em blogtailors.com/tag/estatísticas+e+números, blogue de Booktailors Consultores Editoriais. Referia que as “vendas da Amazon cresceram 22 % no primeiro trimestre daquele ano [2013]. Outra notícia no mesmo espaço, publicada em 16 de abril de 2013, refere que “as vendas digitais ascendem a quase um quarto do mercado editorial norte-americano [via “eBook Portugal”].

Começam a aparecer algumas editoras, com subsidiárias / livrarias virtuais, para comercialização de eBooks. Por exemplo, e sem querer publicitar ou dar visibilidade gratuita, a Wook (do Grupo Porto Editora) que, em 9 de maio de 2016, refere no seu site que é “a maior livraria em Portugal”, tendo “700 mil clientes registados e um catálogo com mais de 8 milhões de livros e eBooks”. Aponta a sua estratégia para a comercialização de eBooks, nomeadamente “uma solução inovadora que vai definir e impulsionar o mercado de eBook em Portugal”. Disponibilizou informação que diz facilitar “a entrada de todas as editoras portuguesas, pequenas, médias ou grandes, na realidade do eBook”, fazendo-o chegar aos leitores o produto pela via digital, “independentemente dos aparelhos e respetivos sistemas operativos”.

Ainda no blogue de Booktailors, numa notícia de 25 de junho de 2015 e com base num estudo feito pela Deloitte, é possível ler: “os jovens entre os 16 e os 24 anos não aderem aos livros electrónicos”, mas também não compram livros em suporte de papel; dos inquiridos “apenas 14% disse ler mais de uma hora por dia”, acrescentando que isto poderá acontecer devido à “ausência de hábitos de leitura dos mais novos”; neste grupo etário, “58% destes jovens passa mais de uma hora a ver televisão”, apesar de 34% ter respondido que “leem mais agora [2015] do que em 2010”.

A solução dos problemas neste setor [na ótica do autor] passará pela edição de autor, devendo o mesmo, posteriormente, arrojar-se na difusão da obra através da Amazon (ou outra similar), como o caso recente de uma jornalista transmontana, a trabalhar numa estação de TV europeia, que tem as suas obras disponíveis neste imenso mercado e que diz que as vendas vão acontecendo regularmente?

Ou passará pelo eBook, em que nós, produtores de conteúdos (com os nossos contos, romances, poesia, ensaios…) nos sentimos tantas vezes impotentes para “ter mais voz ativa”? Será que agora, com a diminuição das vendas dos livros nas livrarias, pessoas como tantas que conheço (de que dei aqui apenas um “cheirinho”) podem finalmente publicar os seus trabalhos e fazer com que um número apreciável de leitores os leiam, a custos relativamente baixos para os leitores e gratificantes e justos para os autores?

Será que vai acontecer às pequenas e médias editoras de livros o mesmo que aconteceu às várias editoras de música, com quase desaparecimento destas e venda da música pela via online? Será a mesma coisa ter livros digitais e não os nossos queridos livros de papel na estante e poder manuseá-los, sempre que nos apetecer? Pelo que se passa com os álbuns das fotografias digitais, abandonando-se os “velhos álbuns” com as fotos em papel… tenho muitas dúvidas! Mas por causa dessas dúvidas… o melhor será ter a ousadia de experimentar, confiante, para acompanhar a evolução dos tempos.

1 comentário:

  1. Ó meu país! onde temos que pagar para trabalhar... pagar para editar... Ó meu país! Abraço.

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