sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

ALI VAI O HOMEM… DE GUIMARÃES!

JOAQUIM DA SILVA GOMES
Apesar de próximos, as relações de boa vizinhança nem sempre existiram entre os concelhos de Braga e Guimarães. Um dos momentos em que atingiu um clima de grande tensão social ocorreu no dia 28 de novembro de 1885. 

Tudo se desencadeou quando foi apresentada à Junta Geral do Distrito de Braga a proposta de criação das cadeiras complementares do Curso de Ciências no Liceu de Braga. Esta questão mereceu a discordância dos procuradores de Guimarães (Luís Costa - Conde de Margaride; José Montenegro e Joaquim Meira) que se encontravam aí representados e que, desta forma, evitaram que fosse votado esse projeto. Esta posição originou enormes conflitos em Braga. 

Assim, na Associação Comercial de Braga, reuniram-se um conjunto de personalidades, lideradas por Manuel Cândido Loureiro, em cuja sessão ficou decidido solicitar aos procuradores da Junta Geral do Distrito de Braga a votação do referido projeto. Terminada essa sessão, a multidão aí concentrada, composta maioritariamente por estudantes, resolveu percorrer as ruas da cidade, com uma banda filarmónica à frente. Dirigiram-se depois para o Hotel Real, onde se encontrava hospedado o presidente da Junta Geral, no sentido deste colocar à votação o referido projeto, na sessão da Junta, que se realizaria no dia seguinte (sábado, 29 de novembro). 

Em torno deste entusiasmo, ocorreu um episódio que acabaria por marcar de forma tensa as relações entre Braga e Guimarães: no meio de uma multidão, de mais de duas mil pessoas, ouviu-se um grito de “Ali vai o homem”, referindo-se a um procurador de Guimarães, contrário ao projeto, e que acabava de sair do Governo Civil. A multidão depressa se dirigiu para ele, que mal teve tempo de se colocar na sua carruagem e sair disparado na direção de Guimarães. Pela então Rua das Águas, a carruagem do procurador vimaranense desceu a toda a velocidade, sob os apupos da multidão. Entretanto, não faltou quem lhe atirasse pedras, ovos e até martelos, sapatos e panelas velhas! 

Mal souberam do sucedido, reuniu-se em Guimarães uma multidão, convocada, entre outros, pelo visconde de Lindoso, visconde de Santa Luzia e barão de Pombeiro, cujo objetivo era responder aos protestos ocorridos em Braga. De imediato surgiu uma proposta radical: separar o concelho de Guimarães do distrito de Braga e criar o distrito de Guimarães, ou anexar Guimarães ao distrito do Porto! Ficou ainda decidido criar um jornal intitulado, precisamente, “28 de novembro”, data dos graves acontecimentos ocorridos em Braga. Contudo, a ideia da desanexação de Guimarães do distrito de Braga já tinha surgido cinco anos antes em Guimarães, numa reunião da Associação Comercial, realizada no dia 31 de outubro de 1880.

Outra das figuras que, do lado de Guimarães, se destacou nas manifestações contra Braga, foi o célebre Martins Sarmento!

Em Braga ironizou-se, dizendo que Guimarães poderia “constituir um estado, com o seu Paço sem bispo, palácio sem rei, ponte sem rio, e gente sem lei”! (1) 

Já em Guimarães dizia-se: “Deus nos livre”, de Braga!

Quando se pensava que as relações entre Braga e Guimarães iriam acalmar com o Natal e o início de um novo ano verificou-se o contrário, transferindo esta questão para o plano nacional. Isto porque o deputado João Franco Castello-Branco apresentou um projeto de lei no qual solicitava a desanexação do concelho de Guimarães do distrito de Braga.

A Câmara Municipal de Braga reuniu-se algumas vezes, decidindo numa dessas sessões (de 14 de janeiro de 1886) proceder a uma auscultação aos “cavalheiros que representam os differentes partidos na localidade e bem assim o presidente da Associação Commercial, Associação de Artistas, os Directores de Bancos e Companhias e os deputados do Districto que se acharem em Braga”. De seguida, foi enviada uma exposição ao Governo.

No dia 16 de janeiro de 1886 realizou-se uma reunião extraordinária da Câmara Municipal de Braga, para a qual havia sido solicitada a “coadjuvação de toda a imprensa da localidade”. Nesta sessão marcaram presença, de facto, todos os redatores dos jornais da região e ainda os correspondentes de Braga para as diversas “folhas do país”. 

O tema prendia-se com a desanexação do concelho de Guimarães do distrito de Braga facto que, a ser levado por diante, representava um “attentado contra os princípios da Administração, era hum afronte á dignidade (…) d’esta cidade e de todo o Districto”. 

As agitações que ocorreram em Braga e Guimarães foram aproveitadas de forma sublime pela oposição e estiveram na origem da queda do governo do conhecido Fontes Pereira de Melo, a 20 de fevereiro de 1886!

1) jornal “O Commercio do Minho”

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