quarta-feira, 19 de julho de 2017

BEBÉ ESPECIAL

ELISABETE SALRETA
O que significa ter um bebé especial?

É cuidarmos de alguém que na sua limitação dá-nos muito mais do que lhe damos a ela. É um amor sem barreiras, sem vergonhas e cheio e orgulho pela diferença, porque essa desigualdade é rica e traz um mundo ao nosso mundo.

Mia, um amor tão grande na adversidade.

Não sei o que lhe aconteceu, mas sei o que poderia ter acontecido sem a minha intervenção. E sem o saber, eu ficava mais pobre. Tenho uma outra riqueza que me custou tanto aceitar e admitir. Hoje sei que ensinou-me tanto sobre a entrega e o amor, que não sei como algo tão simples tinha-me escapado antes. Óscar. Hoje cuido e sou abençoada por dois bebés especiais.

Mia Chegou até mim numa situação limite. Numa semana mostrou ser o gatinho que era, com as suas limitações. Ou que tentava ser. Não sabe o que é brincar, mas quando lhe fazemos cócegas na barriguita que já se começa a notar, agarra a nossa mão e lambe os dedos, morde ao mesmo tempo, sem saber o que fazer. Brinca com o Óscar, mas até ele tem medo de magoa-la com os seus 7 kilos. Ela toca-lhe nas patas e ele devolve-lhe o toque. Depois ele tenta agarra-la para a lamber, e ela deita-se de barriga para cima, confiante nesta sua nova família. Esta semana brindou-me com um fsssst simpático e umas quantas rosnadelas. Só o faz a mim. Mas sou eu quem lhe dá a medicação e trata das orelhas, não admira.

Mia é cega. Por isso não brinca, não corre atrás de uma bola, não morde a cauda dos outros gatos, nem sobe o sofá. Não amarinha pelas nossas pernas acima, mas abana o rabinho e salta para um destino imaginário. Mia não mia como os outros gatos fazem aos humanos, faz apenas um som característico como fazem entre eles, os gatos. Ela não sabe que a família dela é diferente, mas sente-se bem, protegida. Nada mais importa. Mia não faz buraquinho na areia. Não é caracteristicamente um gato. Não teve tempo de aprender a ser um, mas é um bebé que sabe quem cuida dela, pois vem até nós e encosta-se aos nossos pés, como um filhote procura o colo da mãe. Sofre de stress, pois caminha sem parar, sem destino, pela casa, caindo de sono no primeiro tapete que encontra. Come até não poder mais, mas aprecia mais carne, peixe, ovo, do que a ração. Isso só quando o prato dela está vazio.

Apesar de tanto sofrimento, entregou-se de corpo e alma a nós. Confia. Prenda-nos com as suas lambidelas e alguns ronrons. Não tem um grama de hostilidade. Admiro-a quando se entrega a um sono profundo e por momentos, por alguns minutos apenas, é um gato bebé.

Mas afinal quando acorda, é o meu bebé especial.

2 comentários:

  1. Helder Filipe da Silva Monteiro19 de julho de 2017 às 21:06

    Simplesmente comovente e emocionante. A realidade da bébé especial que estava perdida e teve um lar, graças à Elisabete Salreta!

    Parabéns pelo artigo mas, sobretudo, pela sua atitude, poetisa Elisabete Salreta!

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  2. Interessante relato de carinho entre seres diferentes. Parabéns.

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